PRIMEIRA
INFÂNCIA
Segundo Jean Piaget, quando a
criança nasce há indissociação entre seu corpo e o ambiente no qual está
imersa. Porém, devido à capacidade que tem para reagir ao meio, à chupeta, ao
alimento, às pessoas etc., a noção de objeto vai sendo construída durante os
seis estádios do período sensório-motor.
A elaboração desta noção vai
depender do equilíbrio entre a assimilação e a acomodação, ou seja, da
incorporação dos dados da realidade aos esquemas disponíveis do sujeito
(assimilação) e da modificação dos esquemas para assimilar os dados novos
(acomodação). Mas nem sempre estas duas funções estão totalmente equilibradas.
Até o terceiro estádio, não há
separação nítida entre assimilação e acomodação. Por isso, o equilíbrio
completo entre as duas funções não é possível. O bebê não pode interagir com o
ambiente, de forma intencional. Se o objeto é assimilado ou conhecido (“isto
serve para ser olhado”, “isto serve para ser sugado”), tal fato acontece apenas
no momento em que é acomodado e assimilado ao esquema. O objeto nada mais é que
um produto da ação do sujeito, sem distinção entre ambos.
No primeiro e no segundo
estádios, quando um objeto desliga-se do indivíduo porque desaparece de seu
campo visual, ele não é, geralmente, procurado.
Já no terceiro estádio, a criança
limita-se a olhar o local onde viu pela última vez, conservado, portanto,
apenas a atitude esboçada anteriormente. Se não houver reaparecimento do
objeto, haverá sua renúncia. Quando o bico do seio desprende-se da boca do
recém-nascido, desaparecendo do seu campo perceptivo visual, tátil, gustativo,
etc., a criança mostra desagrado através do choro ou reproduz os movimentos de
acomodação e assimilação dos lábios e da boca, realizados anteriormente no ato
de sucção, para fazer reaparecer as sensações e o espetáculo perdido.
Do quarto estádio em diante,
intensifica-se a separação entre a assimilação e a acomodação, começando a
haver equilíbrio entre ambas. Isto significa que o recém-nascido explora as
características do objeto ou se acomoda – olha, apalpa, cheira, vira, etc. –
antes de assimila-lo. Portanto, há um distanciamento entre o sujeito e o
objeto.
A partir deste estádio, o bebê
não prolonga os movimentos esboçados de acomodação quando o objeto desaparece
ou se distancia em relação ao seu campo perceptivo visual, tátil,
olfativo,etc., mas realiza uma acomodação através de uma exploração ativa dos
meios (esquemas) para vencer ou afastar obstáculos que o separam do objeto. Um
bebê que possui vários esquemas – pegar e sugar; pegar e puxar; olhar e pegar –
seleciona os mais adequados na forma de meios para atingir o objeto – fim - que
está fora do seu alcance.
Assim, pode separar os esquemas
de olhar, pegar, puxar e combina-los para atingir a chupeta e suga-la. Nesta
situação, o comportamento é intencional, marcando o início da inteligência
prática. Nota-se interesse e atenção do sujeito diante dos objetos antes de
tentar assimila-los, ou seja, conhece-los ou utiliza-los.
Embora os avanços na conquista
do objeto, como algo exterior ao sujeito, comecem a ocorrer a partir do quarto
estádio.
A passagem de um estádio para o
outro é percebida através do comportamento infantil, no sentido de procurar um
objeto perdido. Ora, a criança só procura um objeto escondido quando supões que
ele continua existindo em algum lugar, embora não possa vê-lo, tocá-lo etc.
Primeiro estádio (0 a 1 mês) – A criança não procura objetos
desaparecidos
Neste estádio não existe objeto
material ou humano como algo distinto do indivíduo.
O recém-nascido encontra-se
imerso em um mundo de impressões visuais, gustativas, sonoras, táteis, etc.
Nas palavras de Piaget não existe
“(...) nenhuma consciência do eu, isto é, nenhuma fronteira entre o mundo
interior oi vivido e o conjunto das realidades exteriores”.
O bebê só toma conhecimento de um
objeto levado à sua boca em função das sensações gustativas ou cinestésicas
experimentadas. Também não tem conhecimento das pernas, braços, mãos, como
domínio de seu próprio corpo. As mãos chegam a provocar susto ao atingirem
ocasionalmente seu rosto.
Se um impressão como o seio
ocupa o campo perceptivo do bebê e seus lábios ficam em contato com ele, pode
haver a ativação do esquema reflexo de sucção. Porém, neste estádio que o jeito
não tem consciência de si mesmo, nem da realidade que o cerca.
O seio – fim – e a ação – meio –
formaram uma totalidade que é o ato de mamar. A vida afetiva do bebê fica
circunscrita às emoções primárias de prazer, desprazer etc.
Para Flavell “(...) um reflexo é
sempre ativado em bloco, como uma totalidade rígida. Se puder assimilar um
objeto ou acomodar-se a ele sem se alterar, ele o faz. Mas se as propriedades
do objeto levarem à necessidade de alguns movimentos acomodativos novos (...) a
adaptação torna-se impossível”.
Naturalmente, com o decorrer do
tempo, os atos assimilativos reflexos começam a sofrer pequenas alterações, em
função da peculiaridade das coisas. Sabe-se que uma criança suga melhor o seio
após os primeiros dias de nascimento, moldando os movimentos da sua boca às
características do bico do seio.
Porém, segundo Piaget, esta
acomodação consiste simplesmente num ajustamento desses processos aos
pormenores das coisas assimiladas, permitindo uma adaptação do próprio
organismo aos aspectos mais externos e materiais.
Se uma impressão visual, gustativa ou tátil
desaparece do universo infantil, não ocorre nenhuma busca ou exploração
consciente por parte da criança. Ou o quadro entra logo no esquecimento, isto
é, no nada afetivo, ou e lamentado, desejado.
Neste último caso, o comportamento utilizado
para reencontra-lo consistirá na repetição de esquemas já dominados pela
criança: choro, movimentos de pernas, contorção do corpo, movimentos
generalizados.
Segundo estádio (de 1 a 4 meses) – A criança tem encontros fugazes
com objetos desaparecidos, mas não os procura intencionalmente
Como no estádio anterior, a
criança continua submersa num conjunto de impressões sensoriais, não
conseguindo separar seu próprio corpo do ambiente que a cerca.
Se um quadro visual, gustativo,
tátil etc. desaparece, o organismo faz um esforço para conservá-lo através de
assimilação reprodutora.
Se a chupeta, reconhecida como
algo que serve para ser sugado, cai da boca do bebê, há repetição do esquema de
sugar. Neste estádio, o organismo não pode ativar outros esquemas como o de
pegar, puxar, etc. frente à chupeta, porque só o esquema de sugar dá
significado à chupeta e pode assimilá-la. Em outras palavras, a ação de sugar
confere existência à chupeta.
Piaget, entre outras descrições,
relatou que Jacqueline, aos 2 meses, conseguia olhar e acompanhar o
deslocamento de sua própria mãe, até seu total desaparecimento. Contou, também,
que a menina continuava a olhar na mesma direção onde a mãe fora vista a
primeira vez, como se, com isso, esperasse traze-la de volta.
Este comportamento infantil, de
aparente procura do objeto, apóia-se não só em progressos relativos ao esquema
visual – exploração visual – como também na crença de que a repetição de uma
ação pode trazer de volta um quadro perceptivo desaparecido, mas ainda à
disposição. É a atitude mágico-fenomenista.
Neste estádio, a criança
reencontra objetos perdidos, ocasionalmente, e não como conseqüência de uma
procura intencional. Quando ocorre uma pequena exploração para o reencontro,
estas ações são fugazes, “lampejos momentâneos”, no entender de Baldwin.
O lactente, ainda que seja
centro de inúmeras influências sociais, carinhos, cuidados, pressões etc.,
reage às pessoas da mesma forma que aos objetos. Para ele, os estados afetivos
de prazer, sucesso, fracasso etc. dependem d própria ação e não de relações de
trocas com outras pessoas. Se chora, obtém o alimento, por isso sua ação de chorar
é responsável pelo prazer e pelo aparecimento do alimento.
A afetividade manifesta uma
espécie de egocentrismo geral, onde o bebê tem interesse apenas pelo seu
próprio corpo e pela sua própria atividade. Para Piaget, podemos até chamar
esta afetividade de narcisista, mas devemos ter bem claro de que é um narcisismo
sem Narciso, porque não existe consciência pessoal.
Terceiro estádio (de 4 a 8 meses) – A criança chega
até o objeto desaparecido, mas não existe um comportamento intencional de busca
No terceiro estádio
inicia-se a separação entre o sujeito e o objeto. Quando a chupeta que está
sendo sugada cai da boca da criança, o comportamento não é de indiferença mas
de certo desconforto. O bebê esboça uma procura do objeto desaparecido de seu
campo perceptual visual, tátil, gustativo, reproduzindo os esquemas
interrompidos na esperança de, com esta atividade, trazer de volta as sensações
experimentadas e perdidas. O bebê espera encontrar a chupeta, uma vez que
desencadeou as ações de olhar e sugar que estão de certa forma fundidas.
De acordo com Piaget, “Uma diferença essencial opõe (...) tais
comportamentos À verdadeira busca dos objetos. Esta última é ativa e faz
intervir movimentos que não se limitam a prolongar, unicamente, a ação
interrompida, ao passo que nos comportamentos presentes, ou há uma simples
expectativa ou então a pesquisa continua meramente o ato de acomodação. Nestes
dois últimos casos o objeto esperado é, portanto, relativo à própria ação”.
Piaget descreveu inúmeras situações onde
ocorreram comportamentos típicos deste estádio de desenvolvimento. Entre eles,
relatou que Luciene, aos 8 meses, foi observada buscando sistematicamente com
os olhos tudo que deixava cair. A busca do objeto era feita a partir do local
onde ele caíra. Isto significa que a criança continuava repetindo o esquema de
olhar, usado momentos antes, na expectativa de que o ato de seguir com olhos
trouxesse o espetáculo de volta.
Piaget relatou, também, que Luciene, numa
outra situação, buscava com maior interesse reencontrar objetos caídos que
haviam estado anteriormente em suas mãos. Ao acompanhar o deslocamento com os
olhos e com as mãos, Luciene esperava que o gesto faria reaparecer o quadro
visual perdido.
Esta situação revelava um progresso em relação
à anterior, porque o objeto era procurado onde havia caído e não mais no local
onde havia sido visto pela primeira vez. Porém, a finalidade da ação era,
ainda, prolongar um espetáculo visual-tátil que dava prazer e não realizar uma
acomodação adaptativa.
Os exemplos apresentados sugerem que os
objetos chamam a atenção da criança, mas ela não tem condições para explora-los
e busca-los com apoio na coordenação de esquemas 9olhar, pegar, sugar etc.). O
interesse incipiente leva à procura dos objetos desaparecidos, mas só através
do prolongamento de movimentos já ativados: se o caminho percorrido por estes
movimentos for uma linha reta, poderá até levar onde eles estão escondidos
(cobertos por um pano, por exemplo) no final do percurso. Portanto, o encontro
é, praticamente, ao acaso, propiciado pela continuidade dos movimentos dos
olhos.
Na interpretação de Baldwin, esse fato mostra
que a criança não está fazendo uma busca real, “(...) apenas continua a fazer o
que estava fazendo, quando perdeu o objeto”. E então, para ela, o movimento
esboçado continua responsável pelo aparecimento daquilo que foi perdido.
Quarto
estádio (de 8 a
12 meses) – A criança procura objetos desaparecidos através dos meios ou
esquemas adequados à situação
Neste estádio o objeto destaca-se do sujeito,
uma vez que provoca no bebê um conjunto de esquemas exploratórios ou
acomodadores de olhar, virar, deslocar etc., antes de ser assimilado. Portanto,
os esquemas não são fundidos, como no estádio anterior, mas coordenados.
Assim, olhar pode combinar com pegar, ou com
sugar, dependendo das características do objeto que está sendo investigado. A
conduta passa a ser intencional ou inteligente, havendo um intervalo entre a
necessidade de incorporar o objeto e a consumação do ato assimilatório.
Diante de um objeto, a criança pode ativar
primeiro o esquema de olhar, depois o de pegar e, finalmente, o de sugar, numa
seqüência de ações marcadas pela atenção e pelo interesse.
A respeito deste estádio, Piaget afirmou que
há um progresso na consolidação dos objetos quanto À acomodação de uma série de
esquemas visuais, táteis etc. que implica a coordenação de múltiplos esquemas
primários. Na exploração do objeto, de agora em diante, os meios são escolhidos
em função de fins desejados (conhecer, usar, procurar etc.) e não aleatórios,
como anteriormente.
Nas palavras de Piaget, “(...) a criança já não se limita a seguir
com os olhos ou com a mão qualquer coisa em movimento: passa a unir exploração
visual à exploração tátil. Ora, essa coordenação de duas ou mais séries
distintas de acomodações reforça indubitavelmente a consolidação e a
exteriorização do objeto (dissociação entre o objeto e a ação do sujeito)”.
Exemplificando, podemos dizer que, se um alvo
desejado á impedido por um obstáculo qualquer, a criança adia a posse deste
alvo e procura meios para vencer ou contornar essa dificuldade. Desta forma,
quando o bebê está diante de alguma coisa que lhe interessa, mas que está fora
de seu alcance, agarra a mão do adulto e a impele na direção procurada. Existe
uma intenção nítida de remover o obstáculo (distância) que impede o acesso ao
objeto. Há uma busca ativa com adiamento da ação final – pegar o objeto –
porque são desencadeadas ações intermediárias – pegar e impelir com a mão.
Diante de um objeto como, por exemplo, uma
bola que desliza alojando-se sob um sofá (A), a criança que acompanhou os
deslocamentos da bola é capaz de repetir os movimentos da mesma, vencendo a
distância e apanhando o objeto. Porém, se a bola desloca-se de sob o sofá (A)
para sob a poltrona (B), não é procurada neste lugar, mas no primeiro (A). O
sujeito não pode combinar a seqüência de deslocamentos que vão do sofá (A) até
a poltrona (B) porque se fixou no primeiro momento em que obteve sucesso e
ignorou o segundo momento.
Os avanços cognitivos deste estádio são
acompanhados de avanços sociais e afetivos. Os objetos físicos e humanos
começam a ser percebidos como externos ao sujeito. A inquietude que a criança
experimenta em relação às pessoas estranhas sugere que estas são elementos que
precisam ser compreendidos, da mesma forma que os elementos físicos.
As pessoas chamam a atenção da criança porque
suas reações são diferentes das dos objetos físicos. Quando um bebê chora para
obter conforto, as pessoas podem reagir dando-lhe resistência (repreendendo
verbalmente, com movimentos de desagrado etc.).
Portanto, a criança
pode sentir que, dependendo de sua conduta em relação ao outro – meio – pode
obter resultados como prazer, conforto, sossego, segurança, asseio etc. A ação
do choro não é mais a responsável pelo seu conforto. A interação com o outro
gera não só este tipo de conhecimento, mas propicia modelos sociais que são
copiados e imitados, desencadeando um novo tipo de comunicação social.
Junto à comunicação
feita com ajuda (gestos, mímicas) surge uma comunicação incipiente com o apoio
de palavras. A palavra, copiada através da imitação do outro, consiste numa
parte do conjunto de ações que conferem significado às coisas.
Se a criança ouve o
som “miau” ou “ga-to” à medida que passa a tocar um gato, a sentir a lisura de
seu pêlo e a agudeza de suas garras, passa, num determinado momento, a designar
todo o contexto relativo a esse animal pelas palavras “miau” ou “ga-to”. Porém,
a palavra não dispensa o contato com o outro e é muito pobre como instrumento
de comunicação social.
Quinto estádio (de 12 a 18 meses) – A criança procura ativamente o
objeto desaparecido do seu campo visual, tátil etc., através da descoberta de
novos meios
Neste estádio
consolida-se a idéia de que o objeto é algo externo ao sujeito, embora ainda
não possa ser representado. Diante de qualquer novidade, o organismo procura os
esquemas mais apropriados para compreendê-la e assimilá-la.
Para ser compreendido,
um objeto novo apresentado ao sujeito sofre o impacto de inúmeras ações
exploratórias. Uma palavra nova provoca inúmeros fonemas que podem ser
combinados imitando o modelo ouvido. Uma situação-problema – alcançar um objeto
distante – leva a uma experimentação ativa dos esquemas mais adequados para a
combinação que conduzirá À adaptação sensório-motora.
Em todas estas
situações, observa-se que os esquemas podem ajustar-se mutuamente e a criança
pode examinar de forma mais eficiente os pormenores dos objetos sobre os quais
exerce sua ação. Em todas estas situações ocorre equilíbrio entre a assimilação
e a acomodação.
Os comportamentos
exploratórios mais ou menos causais cedem lugar a comportamentos exploratórios
nitidamente intencionais. Ao tentar virar uma caixa, por exemplo, o bebê age
sobre ela de várias formas, procurando verificar até que ponto estas ações
conseguem desloca-la.
A criança descobre,
através de comportamentos como estes, que ela tem poderes para vencer a
resistência que os objetos oferecem à sua ação, para descobrir como eles
funcionam, para que servem etc.
Sexto estádio ( de 18 meses em diante) – A criança procura
ativamente o objeto desaparecido através da invenção de novos meios
A elaboração da noção
do objeto como algo separado do sujeito é concluída neste estádio, devido à mobilidade e à interiorização dos
esquemas.
O sujeito pode
construir a imagem de uma bola, por exemplo, evocando com esta imagem as ações
que executou sobre ela: chutar, atirar, rolar etc., assim como imaginar os
deslocamentos do objeto no espaço.
Isto acontece porque o
objeto continua existindo na mente do sujeito, embora esteja ausente de seu
quadro perceptual. Por isso, a criança não se desespera quando vê a mãe saindo
por uma porta ou quando sua chupeta desaparece sob o travesseiro, pois já sabe
que estes objetos continuam existindo e se encontram em algum lugar no espaço.
Nos estádios
anteriores, a criança teve oportunidade de executar efetivamente ou de
acompanhar movimentos de objetos em várias direções: em linha reta, fazendo
contornos, realizando inclinações para a direita ou esquerda, voltando ao ponto
de partida etc. Portanto, no sexto estádio, será capaz de representar ou imitar
internamente todo este conjunto de deslocamentos, inventando um percurso para
localizar o objeto ausente.
Para ilustrar estes
avanços na cognição infantil, Piaget descreveu o comportamento de Jacqueline,
quando tinha 1 ano e 6 meses, nestes termos: “Ela (...) atira uma bola para
debaixo do sofá. Mas em vez de abaixar-se logo procura-la no chão, observa o
lugar, compreende que a bola deve ter atravessado o espaço situado sob o sofá e
caminha a pé para ir procura-la atrás do móvel. Porém, tendo uma mesa À sua
direita e estando o sofá encostado a uma cama do lado esquerdo, Jacqueline
começa por voltar as costas ao local onde a bola desapareceu, depois contorna a
mesa e finalmente, chega atrás do sofá, atingindo diretamente o bom lugar, por
conseguinte ela fechou o círculo por um itinerário diferente do que foi coberto
pelo objeto, e elaborou destarte um ‘grupo’, através da representação do deslocamento
invisível da bola e do ‘desvio’ a efetuar para reencontra-la”
Este relato parece
indicar que Jacqueline chegou à conclusão de que existe apenas uma bola que
ocupou uma infinidade de posições e realizou trajetos variados. Parece que
houve compreensão súbita da situação, a partir do momento em que a menina
localizou o objeto-bola e seu próprio corpo no espaço, imaginando uma espécie
de mapa da situação que permite ao sujeito realizar mentalmente um grupo de
deslocamentos.
O egocentrismo
A criança recém-nascida
não tem consciência do mundo físico e social como algo estável, externo e
distinto do mundo interno. O universo é constituído de quadros perceptivos que
desaparecem e reaparecem de um modo caprichoso. A indiferenciação entre o sujeito e suas impressões sensoriais
causadas pelo objeto constitui o egocentrismo no bebê.
Nas palavras de
Piaget, o universo do recém-nascido é “(...) um universo sem objetos, é um
universo em que o eu se absorve nos quadros externos, pelo fato de ignorar a si
próprio (...)”.
O egocentrismo diminui
à medida que a criança vai separando seu próprio corpo dos objetos e termina
quando constrói a noção de objeto. Se quisermos colaborar com a criança neste
processo, devemos dar-lhe condições para que manipule uma variedade de objetos.
Temos, porém, que
oferecer ao organismo – aos esquemas – o alimento intelectual na quantidade
certa e no momento adequado. Detectamos este momento e que alimento melhor
atende às necessidades infantis através da observação da conduta da criança frente
ao ambiente.
Vida social e afetiva da criança
Sentimentos
interindividuais – Com o domínio da noção de objeto permanente, há uma
separação do “eu corporal” em relação ao outro, dando início a um sistema de
trocas sociais e afetivas. Essas trocas, porém, não são genuinamente sociais,
pois são caladas, sobretudo, na imitação de gestos.
Assim, a imitação do
ato da mãe de tocar o rosto do bebê gera-lhe prazer e leva a criança a repetir
este gesto na própria mãe. Por isso, nesta fase, ocorre mais troca de ações do
que de intenções. Embora tais afetos possam ser evocados juntamente com a
imagem de mãe, são pouco duradouros.
Sentimentos
intra-individuais – A criança começa a valorizar a si mesma a partir dos
sucessos e fracassos de suas próprias ações. Na aprendizagem do ato de andar,
por exemplo, experimenta prazer e sucesso ao conseguir dar vários passos, sem
uma queda. A autovalorização gera maior confiança em si e facilitará o
prosseguimento da aprendizagem.
A criança inicia a
autodesvalorização ao experimentar impressões desagradáveis, decorrentes dos
insucessos ou das quedas. Isto repercutirá no processo de aprendizagem,
levando-o a um retardamento.
A regra motora, em
seus primórdios, confunde-se com o hábito. Este abrange uma seqüência de ações
que, ritualizadas e cristalizadas, conduzem a uma adaptação, como o hábito de
andar, por exemplo.
Para Piaget, um hábito
transforma-se em regra quando há consciência da regularidade na sucessão de
ações, acompanhada do sentimento de obrigatoriedade. Isto só ocorre quando
existe uma oposição à realização das seqüências de ações e, especialmente,
quando o indivíduo sai de si mesmo para conviver com o outro. Em outras
palavras, a criança, ao nascer, não é boa nem má do ponto de vista intelectual
ou moral, mas é “dona de seu destino”.
A intencionalidade e
regularidade da atividade motora não visa, inicialmente, uma verdade, mas um
resultado objetivo ou subjetivo. Dependendo das circunstâncias ambientais, esta
regularidade torna-se racional ou lúdica.
O jogo – No início do desenvolvimento sensório-motor é fácil
separar a ação adaptativa da ação lúdica. Um bebê pode repetir um gesto, como,
por exemplo, o de pegar, para incorporar um objeto ou simplesmente para
exercitar um esquema recentemente adquirido a fim de obter prazer.
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