MATURIDADE ou fASE ADULTA
Estudos apresentam uma visão dinâmica desta fase da vida: fases do ciclo de vida, perspectivas de desenvolvimento, processo de maturação.
A primeira percepção que se pode ter acerca da vida adulta é de que ela corresponde a uma época estável, sem grandes mudanças. As transformações físicas mais evidentes efectuaram-se no período da adolescência, tendo também nesse mesmo período, o indivíduo ‘construído’ a sua própria identidade. Assim, nesta perspectiva, a vida adulta é uma etapa de estabilidade, onde a personalidade do indivíduo não sofre alterações. O adulto é concebido como alguém que sente adversidade pela mudança, onde o ditado português ‘burro velho não aprende línguas’ confirma a ideia generalizada de que este não está disposto a efetuar grandes alterações e, em particular, não está inclinado para novas aprendizagens.
No entanto, a literatura tem desde há bastante tempo acentuado que o fato da idade adulta não ser de forma alguma uma etapa de estabilidade e imutabilidade. A nível cognitivo, diversos autores (Perry, 1970, 1981; Brookfield, 1995, 1998; Mezirow, 1978, 1991; Cavanaugh, 1991) consideram que o pensamento formal não é o último estádio de desenvolvimento cognitivo. Piaget deu bastante ênfase à lógica matemática na resolução de problemas, considerando essa capacidade lógica como necessária e inerente ao pensamento formal. No entanto, verifica-se que a cognição na vida adulta está muito mais ligada a questões pragmáticas da vida real, e que os adultos geralmente procuram aprender de forma a resolver problemas da sua vida quotidiana (Knowles, 1986; Smith, 1988; Knapper e Cropley, 1985). Assim, é necessário considerar que a cognição na vida adulta ‘conhece’ outro tipo de operações para além das operações formais: as operações pós-formais.
A discussão neste campo consiste na exploração do que constitui ‘as operações pós formais’; isto é, a atividade cognitiva após o estádio de operações formais identificado por Piaget como o fim do desenvolvimento intelectual na infância e adolescência. O pensamento dialético é descrito como a forma de pensamento adulto pós-formal no qual os modos de pensamento universal e relativo coexistem. A sua essência é a contínua exploração das inter-relações entre regras gerais e necessidades contextuais. A exploração das contradições e discrepâncias entre o geral e o particular é visto como uma oportunidade para o desenvolvimento pessoal. (Brookfield, 1998, p. 292)
Assim, as operações pós-formais na vida adulta acentuam o pragmatismo na resolução de problemas da vida real, a possibilidade de múltiplas soluções, a coexistência entre a relatividade do pensamento (contextualidade) e a universalidade do mesmo (regras gerais). O raciocínio do adulto não segue a lógica formal, sendo, por isso, contextualizado, apresentando, consequentemente, flexibilidade cognitiva. Desta forma, o raciocínio dialético (raciocínio que tem em conta a contextualidade e as regras gerais) é fundamental na interpretação nas experiências do indivíduo adulto, dirigindo a sua ação.
As mudanças ao longo da vida adulta não se limitam apenas ao nível cognitivo, tornando-se necessário conceber esta etapa como um período evolutivo. A vida adulta é percepcionada como a fase onde o indivíduo atinge a maturidade. No entanto, tal não significa que a maturidade seja algo de estático, sendo ‘adquirida’ mal o indivíduo atinja a idade adulta. Diversas correntes epistemológicas (corrente progressista, corrente behavorista, corrente humanista, corrente crítica, corrente construtivista) têm bastante influência na análise desta etapa, significando tal fato que não existe uma visão unívoca e singular deste mesmo período (Caffarella, 1993; Gerstner, 1990; Moura, 1997). Desta forma, procurar-se-à descrever as diversas perspectivas acerca das transformações que acompanham o indivíduo na fase adulta.
A investigação ligada ao estudo do ciclo de vida “está interessada nas respostas que as pessoas criam em relação à idade e mudanças das expectativas sociais à medida que avançam através das fases da idade adulta.” (Cross, 1984, p. 168). Não se trata de uma perspectiva de desenvolvimento, pois estas fases do ciclo são concebidas de uma forma horizontal, sucedendo umas às outras, não sendo necessariamente melhores que as anteriores. Assim, esta perspectiva acentua o fato de se poder identificar períodos de transição e mudança na vida da pessoa, estando esses períodos ligados não só à idade do indivíduo, como também às expectativas sociais que envolvem o mesmo.
Jovem Adulto# Entrada no mundo adulto (22-28 anos) # Transição dos 30 anos (28-33 anos) # Estabilização (33-40 anos) Meia Idade# Transição para a meia idade (40-45 anos) # Entrada na meia idade (45-50 anos) # Transição dos 50 anos (50-55 anos) Culminar da meia idade (55-60 anos) |
Levinson (1974, 1978) considera que a vida adulta é marcada por períodos de estabilidade e transição. Aos períodos de transição sucedem-se momentos de integração, a que correspondem mudanças na estrutura do indivíduo, ou seja, na forma de ele se ver a si próprio, o mundo e os outros. Nestes períodos de transição na vida da pessoa, os papéis (casamento, nascimento de filhos, divórcio, viuvez, etc.) que o indivíduo assume têm crucial importância. A relevância dos papéis ou tarefas específicas, prende-se não só com a forma como o indivíduo encara esses mesmos papéis, mas também pelas expectativas sociais acerca dessas mesmas tarefas. Segundo este autor, a vida do indivíduo é constituída por alternância entre estruturas estáveis e momentos de transição, podendo estas estruturas serem representadas por faixas etárias (quadro).
Lowenthal e seus colegas (1975) procuraram desenvolver os seus trabalhos de pesquisa tendo em conta os contributos de Lenvinson. Estes investigadores dividiram os sujeitos da amostra em grupos relativos aos papéis sociais assumidos. Assim, Lowenthal e a sua equipe acentuam a necessidade de se ter em conta a importância dos papéis definidos socialmente na sequência das estruturas de estabilidade e transição, sendo a idade cronológica menos importante nessa mesma sequência. Weathersby (1978) considera que as diversas fases do ciclo de vida são ‘despoletadas’ por acontecimentos marcantes (casamento, ser pai, entrada dos filhos na escola, etc.), e pelas novas tarefas que o indivíduo tem de assumir (olhar-se como adulto, procura de estabilidade e segurança, confrontar a mortalidade, etc.). A tensão criada pelos papéis e novas tarefas que o indivíduo tem de desempenhar geram uma situação de conflito entre as capacidades do indivíduo e a exigência dos novos papéis / tarefas. McClusky (1986) afirma que a mudança na vida adulta é marcada por períodos críticos:
Estes períodos são caracteristicamente produto de experiências decisivamente importantes para as pessoas envolvidas durante as quais podem ocorrer mudanças marcantes nos papéis sociais e no sentido das relações interpessoais. Entrada no mundo do trabalho, progressão na carreira, transferência de trabalho, desemprego podem representar uma categoria destes acontecimentos. Casamento, o nascimento de uma criança, a morte de um dos conjugues (…) ilustram uma outra categoria. (p. 161)
Diversos autores (Cross, 1984; Knox, 1986; Smith, 1988; Cavaliere, 1990) acentuam a importância destes acontecimentos como momentos por excelência em que o adulto está mais ‘disponível’ para efetuar novas aprendizagens, pois necessita de dar resposta aos novos problemas que se lhe colocam na sua vida quotidiana. Brookfield (1987) afirma que estes acontecimentos podem ser de duas ordens: positivos ou negativos. Os acontecimentos positivos são aqueles que levam o indivíduo a novas formas de pensamento, em circunstâncias agradáveis. Os acontecimentos negativos obrigam o indivíduo a confrontar-se consigo próprio, sendo eles motivo de novas aprendizagens. Para Smith (1988) estes acontecimentos “permitem aos adultos explorar os seus significados e valores pessoais e transformá-los de forma a torná-los mais congruentes com a realidade. (p. 43).
Riverin-Simard (1984) interessou-se pelo estudo do curso da vida profissional dos adultos, utilizando a abordagem dos ciclos de vida. Uma das principais conclusões da investigação levada a cabo por Riverin-Simard é a de que, durante a sua vida profissional, o adulto vive estados de permanente questionamento. “Os momentos de questionamento não são momentos de excepção na vida adulta; pelo contrário, situam-se constantemente no centro quotidiano da vida no trabalho” (p. 148). Assim, são apresentados três grandes períodos durante a vida profissional:
1) o primeiro é o período de entrada e exploração no mundo do trabalho, onde o indivíduo se dá conta da grande distância existente entre as aprendizagens escolares e as que são requeridas para a prática profissional (20-35 anos);
2) o segundo período é caracterizado pelo processo reflexivo do indivíduo acerca do seu percurso profissional ajudando-o a definir o seu próprio caminho pessoal (35-50 anos);
3) no terceiro período o adulto procura criar as condições para uma retirada proveitosa do mundo trabalho. Ao longo destes três períodos, o adulto vai atravessando nove etapas que se alternam segundo um ciclo de questionamento e estabilização: a vida adulta é, pois, caracterizada por um constante dinamismo.
· Intimidade versus isolamento · Generatividade versus estagnação · Integridade versus desespero |
Se na perspectiva das fases do ciclo de vida acentua-se uma sequência horizontal, onde as diversas fases não são apresentadas como um crescimento para a maturidade ou sabedoria; a investigação dos estádios de desenvolvimento apresentam uma progressão de níveis numa linha vertical, ou seja, cada estádio é qualitativamente melhor e superior ao que lhe antecede. Esta perspectiva considera que o indivíduo está em crescimento contínuo, desde formas simples de vida até formas mais complexas, ou seja, da imaturidade até à maturidade.
Erikson (1963, 1976) dedicou-se ao estudo do desenvolvimento da personalidade, tendo o seu trabalho tido uma grande influência e impacto nos estudos posteriores do desenvolvimento humano. Para este autor o desenvolvimento da personalidade prolonga-se ao longo da vida, interessando apenas na abordagem deste trabalho os estádios da personalidade na vida adulta (quadro). Cada uma das etapas, ou estádios, “relaciona-se sistematicamente com todos os outros e que todos eles dependem do desenvolvimento adequado na sequência própria de cada item” (1976, p. 93). Cada fase é caracterizada por uma crise psicossocial a qual é baseada no crescimento fisiológico, bem como nas exigências colocadas ao indivíduo pelos outros (pais e/ou sociedade): “cada um chega ao seu ponto de ascendência, enfrenta a sua crise e encontra a sua solução duradoura pelos métodos aqui descritos, ao atingir a parte final das fases mencionadas.” (1976, p. 93).
A primeira etapa que marca o início da vida adulta é a crise da intimidade. Intimidade significa capacidade de intimidade sexual, pois agora a genitalidade desenvolve-se com vista à maturidade genital (ou seja, íntima mutualidade sexual), mas significa também “a capacidade para desenvolver uma autêntica e mútua intimidade psicossocial com uma outra pessoa, seja na amizade, em encontros eróticos ou em inspiração conjunta.” (1976, p. 126). O perigo desta etapa é o isolamento, que significa a incapacidade de correr riscos para a própria intimidade, muitas vezes devido ao medo das consequências dessa mesma intimidade (filhos, responsabilidades familiares, etc.). A verdadeira intimidade só é possível se o indivíduo já tiver desenvolvido a sua identidade (estádio anterior à intimidade). “Se continuarmos o jogo de formulações ‘Eu sou’, no caso ‘para além da identidade’ teremos de mudar de linguagem. Pois agora o incremento de identidade baseia-se na fórmula ‘Nós somos o que amamos’.” (1976, p. 138).
A etapa da generatividade é a fase da maturidade da pessoa humana. “A generatividade é, pois, de modo primordial, a preocupação em estabelecer e orientar a geração seguinte.” (1976, p. 138). No entanto, o fato de se ter ou querer ter filhos não significa automaticamente generatividade. O conceito de generatividade inclui a capacidade de produtividade e criatividade da pessoa na relação consigo própria e com os que a rodeiam. Generatividade significa, pois, capacidade de ir para além dos interesses pessoais, de ir para além das certezas pessoais. O perigo desta etapa é exactamente esse, a que Erikson denomina de estagnação. “Sempre que tal enriquecimento falha completamente, ocorre uma regressão e uma necessidade obsessiva de pseudo-intimidade, por vezes, com um difuso sentimento de estagnação, tédio, depauperamento interpessoal.” (1976 p. 138-139).
Finalmente, a última etapa corresponde ao culminar do progressivo amadurecimento da pessoa humana: a fase da integridade. Este crescimento permite ao indivíduo ser capaz de aceitar o seu ciclo vital e daqueles que se tornaram significantes ao longo desse mesmo ciclo. Na integridade, a pessoa não receia encarar todo o seu ‘caminho percorrido’, levando-o a compreender o percurso das pessoas que acompanharam o seu ciclo de vida, “livre do desejo de que eles fossem diferentes, e uma aceitação do fato de que a vida de cada um é da sua própria responsabilidade.” (1976, p. 140). O perigo desta etapa reside no desespero: “ a sorte não é aceite como estrutura de vida, a morte não como sua fronteira finita.” (1976, p. 140). Assim, o desespero manifesta o fato de o indivíduo sentir que o tempo é demasiado curto para voltar a recomeçar a sua vida com vista a encontrar rumos alternativos para a integridade.
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Loevinger (1976) apresenta o conceito de desenvolvimento do ego que fornece um quadro de referência sobre a forma do sujeito se ver a si próprio e aos outros (quadro). Para esta autora, os estádios mais baixos correspondem a uma perspectiva individualista e egoísta do eu. A fase consciente corresponde ao ‘início’ da capacidade crítica de se auto-julgar e avaliar. Nos estádios seguintes o indivíduo vai-se tornando mais autónomo, com capacidade de se dar conta da complexidade do mundo que o envolve. Neste modelo de desenvolvimento, a sucessão de etapas é marcada pela passagem de um forma simples e estereotipada de pensamento, para a capacidade de se estar ciente das múltiplas e diferentes possibilidades de visões acerca da sociedade e acerca de si próprio; ou seja, nos últimos estádios está-se ao nível do pensamento pós-formal, já referido anteriormente.
Abordando o desenvolvimento intelectual do indivíduo que se efetua ao longo da vida, Perry (1970) apresenta um modelo de nove estádios, existindo entre cada um destes nove estádios, fases de transição. Este modelo refere uma evolução de formas concretas para formas abstratas de pensamento, de uma forma simplista e unidimensional para perspectivas multidimensionais e complexas de conhecimento, de uma forma de instância externa de autoridade (existindo um dualismo entre a autoridade que tudo sabe e o indivíduo que pouco ou nada sabe) para uma maior autonomia e comprometimento com os valores pessoais na relação com o conhecimento. Grow (1991) e Kaswrom (1992) mostram nas suas investigações que os adultos, em situação de aprendizagem, apresentam diversos níveis ao nível da autodireção: desde adultos que vivem numa dependência quase total da autoridade externa (professor, instituição educativa), a adultos que são altamente autodirigidos nas suas aprendizagens e na relação com a autoridade.
Nesta linha de abordagem do desenvolvimento cognitivo na vida adulta, King e Kitchener (1994) falam da evolução ao nível do raciocínio reflexivo, que segundo as autoras, é caracterizada por sete estádios de desenvolvimento. Os primeiros três estádios correspondem a uma fase pré-reflexiva, onde o indivíduo assume existir a 'resposta correta' para todos os problemas. Os dois estádios seguintes são considerados quase reflexivos: no quarto estádio o conhecimento já é entendido como incerto, não existindo contudo uma discriminação da qualidade das diferentes opiniões individuais; no quinto estádio o conhecimento é considerado como subjetivo, existindo a consciência da existência de diferentes perspectivas. Segundo as autoras, apenas os últimos dois estádios são reconhecidos como pensamento reflexivo. Nestes últimos estádios, o indivíduo vê o conhecimento não como algo adquirido e imutável, mas como algo que deve ser ativamente construído pelo sujeito, numa relação muito estreita com o contexto em que esse mesmo conhecimento é gerado. No sexto estádio o indivíduo considera que as crenças podem ser justificadas através da análise da evidência dos diferentes pontos de vista, ou dos diferentes contextos. No sétimo estádio o indivíduo reconhece que as ideias e pressupostos devem ser confrontados com a realidade, podendo esse processo de inquérito ser falível. O conhecimento resulta, assim, do processo de exame racional, podendo ser sempre alvo do escrutínio e criticismo por parte de outras pessoas.
Labouvie-Vief (1984) considera que o desenvolvimento do indivíduo é constituído por duas fases principais. A primeira fase, que abrange a infância e a adolescência, consiste na descodificação por parte da pessoa dos automatismos biológicos e na codificação dos automatismos culturais e sociais. A segunda fase, que abrange o período pós-adolescência, caracteriza-se pela capacidade do indivíduo reexaminar as diversas estruturas assumidas na fase anterior. Não se trata meramente de uma rejeição das interdependências pessoais assumidas anteriormente, mas sim o resultado de uma análise dos diversos constrangimentos que envolvem o indivíduo, seja na sua forma de pensar, seja na sua forma de agir.
A perspectiva crítica na área da educação de adultos enfatiza as características apresentadas por Loevinger, Perry, Kitchener e King. Brookfield (1985, 1986, 1993, 1995) observa a necessidade do indivíduo ser capaz de estar aberto a perspectivas alternativas da realidade, tornando assim possível a mudança interna na consciência psicológica. O sujeito tem de ser capaz de refletir criticamente sobre a sua realidade que a maioria das vezes é caracterizada por uma aceitação não questionada de valores, normas, e práticas definidas pelos outros. Assim, a reflexão crítica leva a pessoa a dar-se conta das pressuposições hegemónicas, que todos consideram como normais e inquestionáveis. É na inter-relação com os outros que ele acede e valida as visões alternativas da realidade (Garrison, 1989, 1992).
Na sequência do pensamento da corrente crítica, bem como dos estudos de King e Kitchener e de Labouvie-Vief, Mezirow (1978, 1991, 1997), segue a linha de desenvolvimento do indivíduo aplicado a situações de aprendizagem, a que ele chama de teoria transformativa ou aprendizagem transformativa. Não se tratam de novos conhecimentos que são ‘adicionados’ aos já existentes, mas sim de transformação de esquemas de sentido (crenças específicas, atitudes, reações emocionais, etc., que constituem modos de expectativa e interpretação da experiência pessoal), construindo assim uma nova perspectiva de sentido que permitirá uma outra visão da realidade. Para os aprendentes mudarem os seus esquemas de sentido “devem refletir criticamente sobre as suas experiências, a qual por sua vez conduz à transformação de perspectivas” (1991, p. 167).
Para Mezirow a dimensão crucial na aprendizagem dos adultos envolve o processo de justificação e validação de ideias comunicadas, e de pressupostos das aprendizagens anteriores. Estes pressupostos, assimilados na maioria das vezes de forma não crítica, podem distorcer os nossos modos de conhecer. Desta forma, a reflexão envolve a análise crítica destes pressupostos. A aprendizagem reflexiva torna-se transformativa quando os pressupostos, ou premissas, são vistos como distorcidos, incorretos, e inválidos. A aprendizagem transformativa resulta num esquema de sentido novo, ou transformado. Para este autor, este é o modo específico de aprendizagem na vida adulta:
O desenvolvimento do adulto é visto como a capacidade progressivamente desenvolvida de validar a aprendizagem anterior através do discurso reflexivo e de agir sobre os resultados obtidos. Tudo o que levar o indivíduo a perspectivas de sentido mais inclusivas, diferenciadas, permeáveis (aberta a outros pontos de vista), a validade do que foi estabelecido através do discurso racional, ajuda o desenvolvimento do adulto. (1991, p. 7)
Segundo este autor a transformação de perspectivas é despoletada por dilemas desorientadores. Assim, a transformação de perspectivas “começa quando encontramos experiências, muitas vezes situações de forte carga emocional, que falham em encaixar nas nossas expectativas e por isso mesmo não têm sentido para nós, ou quando encontramos uma anomalia que não tem coerência à luz dos esquemas existentes ou pela aprendizagem de novos esquemas” (p. 94).
I – estádio 0: estádio pré moral II – Nível pré-convencionalEstádio 1 – a orientação da obediência e da punição Estádio 2 – a orientação relativa e instrumental III – Nível Convencional Estádio 3 – a orientação para concordância interpessoal de papéis Estádio 4 – a orientação da lei e da ordem IV – Nível pós-convencional Estádio 5 – a orientação legalista do contrato social Estádio 6 – a orientação por princípios éticos universais |
Kohlberg (1971) abordou o desenvolvimento moral do indivíduo, tendo apresentado numa sequência hierárquica de seis estádios distribuídos por três níveis (quadro):
1) nível pré-convencional,
2) nível convencional,
3) nível pós-convencional.
Este autor segue a perspectiva de Piaget de que o indivíduo, ao nível do raciocínio moral, evolui de um estádio heterómono (estrita adesão a regras e deveres, obediência à autoridade, egocentrismo) para um estádio autónomo (capacidade de refletir sobre as regras de forma crítica, aplicação seletiva destas regras baseado no objetivo do mútuo respeito e compreensão). Contudo, Kohlberg considera que o processo com vista ao alcance da maturidade moral é mais longo e gradual. Para a compreensão do desenvolvimento moral do adulto, interessa analisar o modelo de Kohlberg apenas a partir do nível convencional.
No nível convencional inserem-se os indivíduos que têm um conhecimento básico da moralidade convencional, considerando que as convenções existentes na sociedade são necessárias para a manutenção da mesma. A atitude destes indivíduos não é apenas de conformidade em relação à ordem social, mas também de lealdade e justificação dessa mesma ordem, ajudando na identificação das pessoas e grupos inseridos nessa mesma ordem social. Este nível de desenvolvimento moral é constituído por dois estádios (o terceiro e o quarto). As pessoas no terceiro estádio definem o que é correto a partir das expectativas das pessoas próximas de si, e em termos de papéis estereotipados do que representa agir corretamente. Os indivíduos do quarto estádio vão mais além das expectativas das pessoas que são próximas, definindo o que é certo a partir das leis e normas estabelecidas na sociedade.
O nível pós-convencional caracteriza-se pelo claro esforço de definir os valores e princípios morais, e a sua aplicação, para além da autoridade do grupo social e da identificação do próprio indivíduo com esses grupos. Assim, os indivíduos neste nível de raciocínio moral rejeitam uma aplicação uniforme das regras e normas. Este nível é também constituído por dois estádios (o quinto e o sexto). No quinto estádio, a pessoa está ciente do relativismo dos valores e opiniões pessoais, pois a maior parte dessas regras são relativas ao grupo a que o indivíduo pertence, existindo, contudo, alguns valores e direitos que não são relativos (por ex.: vida, liberdade) devendo por isso serem respeitados independentemente da opinião da maioria. No sexto estádio, que não foi verificado empiricamente nos estudos de Kohlberg, o correto é definido pela decisão de consciência de acordo com princípios éticos auto-escolhidos segundo uma lógica de compreensão, universalidade e consistência. Assim, neste último estádio quando as leis violam os princípios éticos, o indivíduo age de acordo com o princípio.
Brookfield (1998) afirma que a aprendizagem moral na vida adulta centra-se em cinco fases interligadas:
1) aprender a estar ciente da inevitável contextualidade do raciocínio moral;
2) aprender que a moralidade é determinada coletivamente, sendo ela transmitida e reforçada por essa mesma coletividade;
3) aprender a reconhecer a ambiguidade do raciocínio moral e a ação moral;
4) aprender a aceitar as próprias limitações morais;
5) aprender a ser auto-refletivo acerca do próprio raciocínio moral, envolvendo “a aplicação da reflexão crítica acerca das nossas decisões morais.” (p. 290).
· Fé Universalizante |
Integrando-se na perspectiva de desenvolvimento da pessoa ao longo da vida, diversos autores (Powers, 1982; Westerhoff, 1980; Wilcox, 1979) dedicaram-se ao estudo da evolução espiritual ao longo da vida da pessoa humana. A sequência destas diversas etapas é caracterizada por uma evolução da dependência das crenças dos outros (pais, grupo, sociedade), para a autonomia, onde o indivíduo é capaz de confrontar os princípios abstratos da fé com a sua realidade quotidiana. Constata-se, pois, nestes estudos o papel das operações pós-formais no modo como a pessoa percepciona a realidade que o envolve.
Tomando em consideração os estudos de Erikson (sobre o desenvolvimento da personalidade), Piaget e Kohlberg (sobre o desenvolvimento moral), bem como os estudos sobre o desenvolvimento intelectual, Fowler (1981, 1984) apresentou um esquema de seis estádios de desenvolvimento espiritual, sendo a vida adulta marcada pelos quatro últimos estádios do esquema proposto por este autor (quadro)
O terceiro estádio é denominado por síntético-convencional. Este estádio é alcançado na adolescência, mas pode prolongar-se durante toda a vida adulta. O conjunto de crenças do indivíduo é a síntese das crenças do grupo a que ele pertence. Por isso, uma das características deste estádio é uma visão insular da crença, estando os princípios éticos fundados na lei e autoridade. O quarto estádio é denominado por individual-refletivo. Como o próprio nome indica, a crença deixa de ser em referência ao grupo, para passar a ser em referência ao próprio indivíduo, tornado-se parte integrante da identidade pessoal, tendo a reflexão um papel importante neste processo. A ‘descoberta’ e abertura das diferenças culturais e do raciocínio moral, desenvolvem no indivíduo uma visão mais relativa e não tão absoluta da realidade: é o início da ‘caminhada’ para o pensamento relativo e dialético. Assim, nesta etapa o indivíduo abandona, em boa parte (mas não totalmente) a perspectiva insular, estereotipada e absoluta da sua crença e da ação moral.
O quinto estádio tem a denominação de conjuntivo. A crença conjuntiva conjuga, de uma nova forma os diversos elementos constitutivos da pessoa humana. Trata-se, pois, de uma nova reintegração e reapropriação que o indivíduo faz da fé, agora tendo em conta não apenas as dimensões abstratas e universais, mas também a realidade, o particular, a experiência. A experiência do indivíduo por volta da meia-idade permite-lhe ter uma outra percepção de si próprio, sendo muito mais paciente com as contradições existentes: este estádio implica pois o desenvolvimento do pensamento reflexivo, crítico e dialético. O indivíduo dá-se conta dos paradoxos existentes na sua crença e aprende a viver com a sua fé e as suas questões. O estádio conjuntivo corresponde, segundo Brookfield (1998), à capacidade de pensamento crítico. No último estádio, denominado por universalizante, a pessoa ultrapassa a tensão existente anteriormente entre o imperativo de viver na solidariedade e os próprios desejos, afetos e ações da pessoa. O indivíduo assume uma perspectiva universal da crença, marcada pela descentração total do sujeito.
Outra percepção acerca do desenvolvimento / crescimento da pessoa humana advém da corrente humanista. Trata-se de uma corrente que tem uma visão naturalmente positiva acerca da pessoa humana, para a qual o indivíduo tem uma necessidade inata de auto-atualização, autodesenvolvimento e autodireção. Assim, na análise da maturidade humana, para além das perspectivas do desenvolvimento e do ciclo de vida, é crucial abordar os autores mais relevantes desta corrente, bem como outros autores que os seguem na descrição da maturidade humana.
Maslow (1970) observa a importância da gratificação de necessidades na motivação humana. Para este autor, o ser humano é marcado por uma dinâmica crescente de satisfação de necessidades. Estas diversas necessidades não se encontram todas ao mesmo nível, sendo possível estabelecer uma ordem hierárquica entre elas (quadro.), estabelecendo-se a seguinte ordem: necessidades fisiológicas, necessidades de segurança, necessidades de pertença e amor, necessidades de estima, necessidades de auto-atualização.
A dinâmica principal que anima esta organização é a emergência, na pessoa saudável, de necessidades menos poderosas a partir da gratificação de necessidades mais poderosas. As necessidades fisiológicas, quando não satisfeitas, dominam o organismo, pressionando todas as capacidades para o seu serviço e organizando estas capacidades para que possam ser o mais eficientes neste serviço. A relativa gratificação submerge-as e permite que o nível seguinte mais elevado na hierarquia surja, domine e organize a personalidade, de forma a que o ser deixe de estar obsessivamente ligado à comida, para se tornar obsessivamente preocupado com a segurança. O princípio é o mesmo para os outros conjuntos de necessidades na hierarquia, isto é, amor, estima, e auto-atualização. (p. 59)
Assim, a motivação humana é orientada pela necessidade de gratificação de necessidades. Enquanto os níveis mais baixos de necessidades não forem assegurados, a pessoa não se preocupa com os níveis seguintes da hierarquia, pois está completamente centrado e motivado para a satisfação das necessidades atuais. Esta teoria da motivação humana concebe a pessoa humana em crescimento contínuo, com vista a ser mais, ou seja, à sua auto-atualização. Trata-se de uma evolução rumo à maturidade, mas que não termina no último nível da hierarquia, pois esse último nível, a auto-atualização, pressupõe um movimento contínuo de crescimento e dinamismo da pessoa.
Maslow identifica o nível mais alto da hierarquia, ou seja o processo de auto-atualização, com a maturidade. A maturação do indivíduo apresenta as seguintes características:
· Maior eficiência na percepção da realidade e relações mais confortáveis com o mesmo. O indivíduo vê a realidade não com os seus olhos e seus preconceitos, mas procura percepcionar a realidade de uma forma aberta. Por isso, está disponível para a novidade, e não se fecha numa capa de segurança e defesa perante o desconhecido.
· Aceitação (eu, outros, natureza). A aceitação de si próprio significa aceitar a sua natureza mesmo com todas as discrepâncias em relação à imagem ideal que deseja e tem de si próprio: "os nossos sujeitos vêem a natureza humana como é e não como eles preferiam que fosse." (p. 156).
· Espontaneidade, simplicidade, naturalidade. A pessoa madura orienta-se por princípios, "sendo o comportamento baseado em princípios fundamentadamente aceites (os quais são percebidos como verdadeiros)." (p. 158).
· Focalização em problemas. A pessoa madura geralmente não está preocupada com os seus problemas; ou seja, não está centrada em si. "Estes indivíduos têm geralmente uma missão na vida, alguma tarefa para cumprir, algum problema fora deles que ocupa muito das suas energias." (p. 159).
· A necessidade de privacidade. Na sequência do aspecto anterior, a relação com os outros não é de forma alguma possessiva e egoísta. A autonomia do indivíduo é caracterizada por "auto-decisão, auto-governo, por ser um ser ativo, responsável e decidido em vez de ser um mero peão" (p. 161). Tratam-se pois de pessoas com capacidade crítica, capazes de se distanciarem das opiniões comuns, modas e propaganda.
· Independência da cultura e do ambiente. O indivíduo em processo de auto-atualização "não tem a sua motivação dependente das satisfações principais do mundo real (...), em satisfações extrínsecas." (p. 162). Assim, é capaz de enfrentar com serenidade os problemas e as circunstâncias adversas.
· Novidade contínua nas apreciações. A pessoa em auto-atualização encara todas as coisas com um espírito de abertura e de novidade, evitando, assim, a rotina, não se cansando das pessoas, coisas e acontecimentos que o rodeiam.
· Experiência mística. Bastantes indivíduos apresentam alguma preocupação e interesse acerca da última natureza da realidade. Trata-se, pois, do fator religioso na maturidade humana.
· Sentimento social. As pessoas em processo de auto-atualização sentem uma ligação profunda em relação à existência humana, apresentando "um profundo sentimento de identificação, simpatia e afeição" (p. 165).
· Relações interpessoais. Os indivíduos maduros são capazes de relações interpessoais mais profundas com poucas fricções, apesar do círculo das pessoas mais chegadas poder ser pequeno.
· Carácter de estrutura democrática. O indivíduo maduro sente um respeito por todo e qualquer ser humano, não sentindo qualquer reserva em aprender seja com quem for. Assim, aceita toda e qualquer pessoa independentemente de raça, religião, cultura, etc.
· Distinção entre meios e fins, entre bem e mal. A pessoa madura rege-se por princípios éticos, indo as suas noções de certo e errado, de bem e mal, para além dos padrões convencionais. Por isso, a sua vida não é inconstante nem confusa.
· Senso de humor não hostil. A pessoa madura possui um senso de humor diferente do comum, não se pactuando com humor que "fere" a pessoa ou que goza com a sua inferioridade. O seu sentido de humor é espontâneo em vez de planeado, e está intrinsecamente ligado à situação em vez de ser adicionado à mesma.
· Criatividade. A pessoa em processo de auto-atualização vive muito menos constrangida e inibida, dando largas à sua espontaneidade, tornando-se criativa, fazendo as coisas de maneira diferente.
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